Publicação em destaque

domingo, 29 de setembro de 2013

Conforto

Falarei convosco.

Contar-vos-ei os meios temores.
As minhas desilusões também.
Nada impede que o faça.
Tudo à volta está confuso, inseguro.
O que julgávamos certo já não o é mais.
Os sonhos que sonhámos são grãos de poeira.
Não há futuro e o presente é doloroso.
Os anos passaram e o que era para ser não foi.

Ó meu Deus ajudai-me nesta travessia.
Dai-me força interior e uma fé
Capaz de tudo enfrentar com sabedoria.
Que eu seja melhor a cada momento,
Mais humilde, mais serena,
Mais despegada desta vida e, não obstante,
Mais próxima dos outros e de vós, Senhor.

Cada minuto, cada hora, cada dia, cada ano,
São degraus e são pedras, são luz e são sombra.

Falarei convosco
E vós me confortareis.

Teresa Sampaio

Salvador Dali

quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Perninhas e pintinha

A Adriana iniciou as aulas do 1.º ano (Básico).

Lembro-me ainda, tal terá sido o trauma (!), que quando passei para a 1.ª classe (chamava-se assim ao 1.º ano), fugi – literalmente – para a infantil – que ficava numa sala quase ao lado, na mesma escola.
Provavelmente não queria perder a brincadeira com que vivia cada dia (e viveria até á Faculdade!). Desconheço se era essa a razão.

Pois a Adriana, que por acaso também é palhaça como a avó Teresa e o pai – anda numa excitação e com uma alegria tão esfusiante desde o primeiro dia, que contagia todos.
Claro que, como já é uma crescida, deixou de dormir a sesta diariamente desde o último ano da creche. Mas quando chega o fim de semana, não resiste a uma boa soneca.
Cada dia é uma descoberta e a Adriana já queria estar no ano seguinte e saber ler. Quer saltar etapas com a rapidez com que o tempo voa para os já avós, mas que, para as crianças parece lento como a eternidade.

A primeira assinatura do seu nome próprio foi uma festa. Agora anda a aprender a fazer o – i .
Então, ontem, a mãe, quando passou pelo corredor, percebeu que a filha estava a desenhar os - i - quando ouviu a Adriana, com aquela vozinha de criança, que todos adoramos, repetir, numa suave cadência:

perninha para cima
perninha para baixo
pintinha.

Com esta melopeia dá música às letras e uma nova vibração à casa, o que me leva a imaginar que, quando souber o alfabeto todo, teremos direito a representação…
  


segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Se ao menos...

As vozes deles arranham-me a alma.
As promessas deles caem em terra infértil.
Agridem-me com as palavras falsas.
Usurpam os meus direitos.
Despojam-me de tudo.

Se ao menos pudesse recuperar
a Esperança, que me tiraram,
Se ao menos o futuro fosse uma
garantia.
Mas como? Se eles destroem o presente
e atrevem-se esbulhar o passado.

Se ao menos a vida
se pudesse pescar já com garantia
contra falsos governantes,
contra políticos corruptos,
contra a Troika e o FMI.


Se ao menos…


Fotografia de © Беляев Александр

sábado, 21 de setembro de 2013

Pátria com fome

Que e o coração vos doa como se uma faca se lhe espetasse,
que o vosso sono seja revolto por pesadelos
que os vossos dias sejam escuros e sem lucros.
que o dinheiro escasseie nas vossas casas.

Só assim podereis ter uma pálida imagem
do que os outros sofrem.

Falo de vós, os responsáveis,
falo de vós os que calais e apoiais,
falo de vós que dizeis - é a vida, sempre assim foi,
falo de vós que, sem querer dar nas vistas,
sois coniventes e ides votar de novo neles.

Falo de todos vós que não tendes vergonha
nem honra, nem dignidade, nem solidariedade.

Falo de vós que não sabeis o que é a
Pátria.


Porto. Fila para a distribuição de alimentos.
Foto de Paulo Pereira

segunda-feira, 16 de setembro de 2013

Ao menos isso...

Ele falou, falou e disse: 
Acabe-se com o que falta para dar cabo da vida dos portugueses. 
O País precisa de empobrecer!
Os jovens  que emigrem!
Os desempregados que sejam criativos.
Os reformados não podem descansar depois de toda uma vida de trabalho. Que a bolsa lhes seja aliviada!


Mas os ricos e poderosos,  fiquem descansados. Nada temam..
Extermine-se os que nada têm e deixe-se morrer lentamente, à fome e por falta de medicação, os reformados pobres.
Para ele, só os poderosos merecem ser poupados. 
Nós pagamos para eles e por eles.
Uns terão que deixar o seu país em busca do trabalho que aqui lhes é negado. 
Outros continuarão a dar as casas aos Bancos, a comer a sopa do Sidónio e a fazer filas para receberem mantimentos do Banco Alimentar, para matarem a fome aos filhos e a própria. As crianças – ele não se lembrou delas – se  comerem uma refeição por dia na escola e se conseguirem livros para estudar nos bancos de trocas  de manuais escolares, podem considerar-se felizes.  Outros terão de enganar o estômago com uma restos de comida dos caixotes do lixo. 
Mas isso que importa?

Ele falou. Falou. Disse o que ninguém queria ouvir.
Mas ele é surdo aos clamores indignados. Escapa-se pelas traseiras. Já tem prática.

Uns dirão que é fado nosso. Outros, que a culpa é da Troika.

Ele que não se incomode: somos os bons alunos da Europa e disciplinados. Temos uma herança de 48 anos de ditadura. 
Por que haveríamos nós de nos indignar agora, quando já nos cansámos a fazer o 25 de Abril de 1974 e perdemos tudo?
Perdão. Tudo não. Ficou-no-nos a Liberdade. É por isso que aqui estamos a dizer o que pensamos.
Ao menos isso....


Fotografias de André Boto

Assombro

Eis-me no centro do assombro,
onde não há distinção nenhuma
entre ser queimado e ser fogo.
No centro do assombro,
mordido pelas chamas
e a mordê-las.

Carlos de Oliveira
In Descida aos Infernos


Tantas vezes me lembro deste poema, quantas as pessoas e circunstâncias que me alarmam de espanto e me ferem. Como quando se estilhaça em mil vidrinhos o caleidoscópio dos sentimentos. Nenhuma afirmação se adequa melhor do que esta de Carlos de Oliveira, quando deambulamos, perdidos, “no centro do assombro”  e nos deparamos com a extrema incomodidade do espanto de existir. Entre o que mordemos e o que nos morde, não há grande diferença. Entre o fogo que nos consome e aquele que ateamos o sinal de união é o mesmo que nos separa.
Os muros que outros erguem são também aqueles que deitamos abaixo para conquistar a liberdade.

Porque de tanto se viver, de tanto de sonhar, ou de tanto imaginar, o ponto de partida acaba por se confundir com o ponto de chegada, no extremo da assombração.



domingo, 15 de setembro de 2013

Partir e deixar o nojo para trás.

Num dia sem cor nem memória.
Apenas tinha o som do desespero.

Partiu. Em busca de futuro.

Tinha habilitações superiores. Tinha experiência. Ainda tinha orgulho.
Mas tinha perdido o essencial, a Esperança no seu país.
Se ficasse, seria, em breve, mais um sem-abrigo, a alinhar nas filas para a sopa.
O linguajar dos governantes e dos outros, que ocupavam o seu país em part-time, eram-lhe odiosos.
Tinham o sabor acre da corrupção e da mentira.
Todos eles eram sequazes dos que mais tinham e mais podiam. Alimentavam-lhes a ganância e espoliavam os mais fracos e desprotegidos.

Partiria sim

Recomeçaria tudo num outro lugar, onde existisse emprego para todos, onde lhe pagassem o seu trabalho justamente, onde pudesse educar livremente os seus filhos, onde tivesse cuidados de saúde universalmente atribuídos, onde, mais tarde, quando se reformasse não lhe usurpassem parte da sua pensão. 
Aliás, onde não lhe usurpassem nada. Nunca.

Deixava o nojo para trás.


© Brian Day.

Caçador caçado

Este caçador consegue ser mais distraído do que eu. E mais tosco.
Isto ainda acaba mal. Para o caçador, é claro.



sexta-feira, 13 de setembro de 2013

O prisioneiro 46664

Sofrer na pele o racismo e o ódio, passar uma grande parte da vida na prisão e, mesmo assim, ser capaz de defender e ensinar o amor, é, para mim, o mais alto exemplo de sabedoria e humanidade.


Matar o futuro

Olho para esta obra notável, para a violência do tema bíblico aqui reproduzida com maestria, para esta oposição fatal e engenhosa entre a luz da inocência indefesa e a sombra negra do crime e, fatalmente, vêm-me à memória alguns políticos e outros nem tanto, que nos roubam a esperança e a vida, que matam, à nascença, o futuro de gerações inocentes.


Pietro Novelli (Il Monrealese), Cain and Abel, c. 1625-47

ทรูมูฟ เอช " การให้ คือการสื่อสารที่ดีที่สุด " Giving

Quando dar é receber.


Isto é bom Karma, ou seja, como diria a Adriana, na sua sabedoria infantil, o que nós fazemos, o universo dá de volta.. 
Não sabemos onde é que ela aprendeu a noção de Karma, nem com quem.  
Nem consta que a Adriana seja budista  e muito menos hindu ou de outra qualquer religião organizada. 
Mas aplicou o conceito, de repente, esta semana, sem o pai esperar e com toda a oportunidade. 

Este vídeo foi criado por uma empresa de telecomunicações da Tailândia
É publicidade no melhor que ela pode sugerir, a sensibilidade e o bem.

Por cá, nós vamos aprendendo com a Adriana.




A rede.

Não sei se o que mais me cativa é a beleza de lançar a rede de pesca, se a arte da fotografia.
Pouco importa.
Existe uma perfeita harmonia entre quem olha e quem é olhado, entre quem vê e quem é visto, e a magia disto tudo pertence à sensibilidade e arte do fotógrafo.



Huang.jpg© Chih Sheng 

quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Há maiorias e minorias.

Nem sempre vale a pena ir atrás da maioria.
Basta lembrar Hitler e a desgraça que ele e a sua maioria causaram no mundo.
E há tantas outras maiorias que conduzem ao desastre...
Prefiro continuar na minoria.



A Escola Nova e a Adriana feliz.

Adriana tem seis pequeninos anos.
É uma menina alegre, marota, brincalhona e doce.
Desafia o sol quando ri e tocam todas as orquestras hinos de flores e alegria quando nos abraça.
Adriana foi finalista da creche, em Junho deste ano, com direito a chapéu preto com borla, teatro, baile e tudo.
Agora vem aí outra etapa, outro desafio que Adriana aceita, contente, galgando degraus.
Na próxima 2.ª feira, dia 16 de Setembro do ano de 2013, que tantas alegrias trouxe à Adriana, ela vai pela primeira vez - primeira vez, ouviram bem - para a escola primária - gosto mais de dizer assim à antiga, do que básica. Básica parece que arranha e sempre é melhor acariciar do que arranhar.
Adriana é letra - A - de todas as promessas - número 1- de quem inicia, de quem lidera, de quem dá o primeiro passo no caminho em frente.
Mas também é da turma 1 B. Ora aqui é que as coisas se compõem.
Porque se - F - deveria ser só de feliz, acontece que não é. Já não tem a exclusividade. Perdeu esse direito que a antiguidade e todos os mestres linguistas lhe conferiram. Se calhar portou-se mal. Sabe-se lá...
Quando soube que a sua turma era 1B, a Adriana disse logo: B de feliz.
E de nada valeu a mãe dizer-lhe que feliz começava com  F e não com  B.
A Adriana repetiu: B de feliz porque eu estou muito feliz. E assim ficou estabelecido. Em forma de lei, de ordem infantil.
Daqui em diante o abecedário tem outro valor, porque a Adriana é FELIZ

Alexander Janssen
Jurga Martin

quarta-feira, 11 de setembro de 2013

Victor Jara - Canto a lo Humano / El Verso es una Paloma (Full Album)



El verso es una paloma
que busca donde anidar,
estalla y abre sus ala 
para volar y volar
Mi canto es un canto libre
que se quiere regalar
a quien estreche su mano
a quien quiera disparar.

Mi canto es una cadena
sin comienzo ni final,
y en cada eslabon se 
enquantra
el canto de los demás.
Sigamos cantando juntos
a toda la humanidad,
que el canto es una paloma
que vuela para alcanzar,
estalla y abre sus alas
para volar y volar

Mi canto es un canto libre.

Victor Jara: El derecho de vivir en Paz






O direito de viver em paz foi brutalmente roubado a Victor Jara e a milhares de pessoas no Chile pelo verdugo Pinochet.

Chile. 11 de Setembro de 1973.

Há exatamente 40 anos, outro 11 de Setembro,  que não o de 2001 nos EUA, ocorreu no Chile em 1973 e as suas consequências repercutem-se até hoje.

Pinochet, um ditador, um assassino sem pudor nem humanidade, subiu ao poder através do golpe de Estado militar, que concretizou nesse dia fatídico, com o apoio da CIA.


O seu regime hediondo durou uma eternidade para as mães e os pais que perderam os filhos, as mulheres que perderam os maridos e os maridos que perderam as mulheres, violadas, torturadas e por fim assassinadas. Muitos continuam desaparecidos até hoje.


Salvador Allende, o Presidente, que tinha sido eleito democraticamente, morreu no Palácio de la Moneda, bombardeado pela força aérea ao serviço de Pinochet, às 14:15 do fatídico dia 11 de Setembro de 1973.



Como milhares de pessoas que foram brutalmente torturadas e assassinadas, encerradas num estádio de futebol, também  o poeta e cantor da  Nova Canção Chilena,  Vitor Jara, cujas canções nós cantávamos, foi preso, torturado e fuzilado. Deceparam-no e o seu corpo foi abandonado na rua de uma favela de Santiago
.

Pinochet manteve-se no poder de 1973 a 1990, instaurando uma das mais brutais ditaduras que o mundo conheceu.
Milhares de pessoas foram e continuam dadas como desaparecidas. Até hoje.
A história deste dia fatídico e de todos os outros que se lhe sucederam, continuam a ser contadas. O fim ainda não chegou. Nem tudo é conhecido.

O corpo do Presidente SalvadorAllende é carregado para fora do Palácio de La Moneda pelos militares de Pinochet, no dia 11 de Setembro de 1973.

 Ainda hoje me arrepio ao lembrar a hora em que soube do Golpe de Pinochet e da morte de Salvador Allende. Eu estava sentada no bar da Associação de Estudantes da Faculdade de Direito de Lisboa. Alguém, não me lembro quem, deu-me a notícia fatídica. O sonho que tínhamos acalentado com o Governo de Allende, tinha-se esboroado em instantes de dor e  amargura. Chorei livremente e, ainda hoje, passados 40 anos, as lágrimas teimam em cair e sinto a mesma raiva por Pinochet. E por todos os ditadores.


http://youtu.be/PIsmf8FeaZU
Chile, Las Imágenes Prohibidas - Capítulo 1 - Full Internacional

Último discurdo de SalvADOR aLLENDE

http://youtu.be/xZeEfXjTNu4

Último Discurso de Salvador Allende, el 11 Sept 1973

"May be man"


Há tantos  "may be man" por este mundo.
Mia Couto define-os, explica-os. Magistralmente.
Como sempre faz.


O MAY BE MAN!
Por Mia Couto 

«Existe o “Yes man”. Todos sabem quem é e o mal que causa. Mas existe o Maybe man. E poucos sabem quem é. Menos ainda sabem o impacto desta espécie na vida nacional. Apresento aqui essa criatura que todos, no final, reconhecerão como familiar.

O Maybe man vive do “talvez”. Em português, dever-se-ia chamar de “talvezeiro”. Devia tomar decisões. Não toma. Sim­plesmente, toma indecisões. A decisão é um risco. E obriga a agir. Um “talvez” não tem implicação nenhuma, é um híbrido entre o nada e o vazio.
A diferença entre o Yes man e o Maybe man não está apenas no “yes”. É que o “maybe” é, ao mesmo tempo, um “may be not”. Enquanto o Yes man aposta na bajulação de um chefe, o May be man não aposta em nada nem em ninguém. Enquanto o primeiro suja a língua numa bota, o outro engraxa tudo que seja bota superior.
Sem chegar a ser chave para nada, o May be man ocupa lugares chave no Estado. Foi-lhe dito para ser do partido. Ele aceitou por conveniên­cia. Mas o May be man não é exactamente do partido no Poder. O seu partido é o Poder. Assim, ele veste e despe cores políticas conforme as marés. Porque o que ele é não vem da alma. Vem da aparência. A mesma mão que hoje levanta uma bandeira, levantará outra amanhã. E venderá as duas bandeiras, depois de amanhã. Afinal, a sua ideolo­gia tem um só nome: o negócio. Como não tem muito para negociar, como já se vendeu terra e ar, ele vende-se a si mesmo. E vende-se em parcelas. Cada parcela chama-se “comissão”. Há quem lhe chame de “luvas”. Os mais pequenos chamam-lhe de “gasosa”. Vivemos uma na­ção muito gaseificada.
Governar não é, como muitos pensam, tomar conta dos interesses de uma nação. Governar é, para o May be Man, uma oportunidade de negócios. De “business”, como convém hoje, dizer. Curiosamente, o “talvezeiro” é um veemente crítico da corrupção. Mas apenas, quando beneficia outros. A que lhe cai no colo é legítima, patriótica e enqua­dra-se no combate contra a pobreza.
Afinal, o May be man é mais cauteloso que o andar do camaleão: aguarda pela opi­nião do chefe, mais ainda pela opinião do chefe do chefe. Sem luz verde vinda dos céus, não há luz nem verde para ninguém.
O May be man entendeu mal a máxima cristã de “amar o próximo”. Porque ele ama o seguinte. Isto é, ama o governo e o governante que vêm a seguir. Na senda de comércio de oportunidades, ele já vendeu a mesma oportunidade ao sul-africano. Depois, vendeu-a ao portu­guês, ao indiano. E está agora a vender ao chinês, que ele imagina ser o “próximo”. É por isso que, para a lógica do “talvezeiro” é trágico que surjam decisões. Porque elas matam o terreno do eterno adiamento onde prospera o nosso indecidido personagem.
O May be man descobriu uma área mais rentável que a especulação financeira: a área do não deixar fazer. Ou numa parábola mais recen­te: o não deixar. Há investimento à vista? Ele complica até deixar de haver. Há projecto no fundo do túnel? Ele escurece o final do túnel. Um pedido de uso de terra, ele argumenta que se perdeu a papelada. Numa palavra, o May be man actua como polícia de trânsito corrup­to: em nome da lei, assalta o cidadão.
Eis a sua filosofia: a melhor maneira de fazer política é estar fora da política. Melhor ainda: é ser político sem política nenhuma. Nessa fluidez se afirma a sua competência: ele sai dos princípios, esquece o que disse ontem, rasga o juramento do passado. E a lei e o plano servem, quando confirmam os seus interesses. E os do chefe. E, à cau­tela, os do chefe do chefe.
O May be man aprendeu a prudência de não dizer nada, não pensar nada e, sobretudo, não contrariar os poderosos. Agradar ao dirigen­te: esse é o principal currículo. Afinal, o May be man não tem ideia sobre nada: ele pensa com a cabeça do chefe, fala por via do discurso do chefe. E assim o nosso amigo se acha apto para tudo. Podem no­meá-lo para qualquer área: agricultura, pescas, exército, saúde. Ele está à vontade em tudo, com esse conforto que apenas a ignorância absoluta pode conferir.
Apresentei, sem necessidade o May be man. Porque todos já sabíamos quem era. O nosso Estado está cheio deles, do topo à base. Podíamos falar de uma elevada densidade humana. Na realidade, porém, essa densidade não existe. Porque dentro do May be man não há ninguém. O que significa que estamos pagando salários a fantasmas. Uma for­tuna bem real paga mensalmente a fantasmas. Nenhum país, mesmo rico, deitaria assim tanto dinheiro para o vazio.
O May be Man é utilíssimo no país do talvez e na economia do faz-de-conta. Para um país a sério não serve.»

Tristeza e dor.

Foi há 12 anos.
Morreram quase 3.000 pessoas.
As novas tecnologias mostraram tudo em direto.
Agressão sem limites. 
Horror nunca antes visto.

O mundo mudou muito desde então.
Não exatamente para melhor.

Foto: Hommage 11 sept 2001 .... Memories ....

**********
Suaviza a dor e a revolta?
Não sei.
Só sei que sabe bem.
Porém, não apaga a tristeza

Mas também apetece o rap.
A música da voz ritmada.
O movimento sincopado dos corpos.



As emoções, a dor, os sentimentos, o grito por gritar expressam-se de muitas formas.
Estas são apenas algumas.
Mas há outras que o coração alberga.
Mostram-se de formas diferentes.
Por agora, o rap é uma delas bem forte, que apetece.

quarta-feira, 4 de setembro de 2013

SÍRIA. O grito


A minha convicção profunda é que o futuro não está escrito em lado algum, o futuro será aquilo que façamos dele.
E o destino? perguntarão alguns, com um piscar de olho ao oriental que eu sou. Tenho por hábito responder que, para o homem, o destino é como o vento para um veleiro. Quem se encontra ao leme não pode controlar de onde sopra o vento, nem com que força, mas pode orientar a sua própria vela. E isto faz por vezes uma diferença dos diabos. O mesmo vento que faria parecer um marinheiro inexperiente ou imprudente, ou mal inspirado, levará a bom porto o outro. [Amin Maalouf. As Identidades Assassinas. Difel]



A imagem das crianças sírias mortas ou refugiadas, a imagem de todos os seres vivos mortos e refugiados, a GUERRA, enfim, agride-me o olhar, esfrangalha-me o coração, revolta-me, insubordina-me, insurreciona-me.



Não sou capaz de pensar e viver apenas (o que já é demais) os problemas do meu país. O mundo inteiro é meu vizinho. Todos os outros são meus irmãos.

Obama, cuja eleição tanto me emocionou e trouxe esperança, vai “atuar” na Síria, com o apoio entusiasta do Congresso norte - americano.
Em declarações aos jornalistas, o presidente da Câmara dos Representantes do Congresso dos EUA, John Boehner, disse que “só os Estados Unidos têm a capacidade de parar Assad e de alertar os outros [governantes] do Mundo que este tipo de comportamento não vai ser mais tolerado”


Tem-se visto os exemplos dignificantes que os EUA têm dado: as intervenções, as invasões, as ocupações, a teimosia crónica em avançar onde quer que haja petróleo, não olhando a meios para atingir os fins, a instituição da mentira. como forma mais cómoda de ocultação da verdade, as operações enviesadas da CIA.


Segundo contas feitas desde a Guerra Revolucionária de 1775-1783, passando por todas as outras guerras, invasões e operações com os nomes mais gráficos como o de “Tempestade no Deserto” até agora, os EUA já estiveram praticamente em guerra mais de 200 anos. 
Lembram-se do Iraque, do Afeganistão, do Vietname, da Coreia do Norte?
Pois é. Agora é a Síria, para não perderam o jeito.
François Hollande arranjou uma manobra de diversão para os problemas graves da França e alinha com os EUA. O parlamento do Reino Unido disse não e David Cameron susteve os ímpetos, O Governo português, todo em biquinhos dos pés, alinha com Barac Obama.

Reparem que ninguém fala em guerra. Agora usam-se "delicadamente" eufemismos, como "ação militar", ou "ações cirúrgicas". Um soldado americano que, por acaso fica sem pernas, foi simplesmente atingido por “fogo amigo”. Tudo muito assético, muito inócuo, muito distante. E não há mortos, não senhor. Apenas e tão só "danos colaterais".
Que vergonha! Isto é lançar gasolina para a fogueira.
Os refugiados sírios passaram de 200 mil para dois milhões em apenas um ano.
Mais de metade dos que fogem da Síria são crianças e os países vizinhos estão a ficar sobrelotados.

No passado dia 23 de Agosto, a Unicef e o O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR)  deram a conhecer que o número de crianças forçadas a abandonar a Síria tinha chegado a um milhão. Acrescem, por outro lado, mais dois milhões de jovens menores de idade que continuam no país, a serem atacados ou recrutados como combatentes.

O alto comissário da ONU para os Refugiados, António Guterres, descreveu a Síria como uma “calamidade humanitária” onde se encontra um número de refugiados “sem paralelo na história recente.









Mas, o mundo pode ficar sossegado, que os EUA e os seus aliados, Israel, França, Portugal e os que mais disserem sim, vão dar boa conta do recado.
O Irão nem sequer constitui uma ameaça… Ora essa...




Bashar al-Assad já avisou que um ataque externo contra o seu regime pode desencadear “uma guerra regional” numa zona do mundo que considera (e não é o único) “um barril de pólvora”.


Quem para Bashar al-Assad?
Quem para os EUA?
Quem para a venda de armas pela Rússia ao Governo da Síria?
Quem para a indústria bélica?
Quem acaba com o apoio nervoso da China a todos os governos ditatoriais, entre os quais, a Síria de Assad se inscreve?
Quem põe fim ao fabrico, venda e uso de armas químicas?



Quem para este fragor de GUERRA?




A comissão senatorial dos EUA para os Negócios Estrangeiros aprovou hoje - 4 de setembro de 2013 - uma resolução que autoriza um ataque militar à Síria. Segundo o Diário Económico, "Esta foi a primeira votação a favor do uso da força desde outubro de 2002, quando o Congresso aprovou a invasão do Iraque, e a quarta vez desde a guerra do Vietname." Acrescenta ainda o mesmo jornal, que "A sessão plenária do Senado deve votar o documento na próxima semana, ficando a faltar a sua discussão e votação posterior na Câmara dos Representantes." Tudo está em marcha.