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segunda-feira, 30 de outubro de 2017

Marcelo.

Marcelo prepara diligentemente a sua candidatura a um segundo mandato.
Avalia passo a passo, abraço a abraço, beijinho a beijinho, o efeito do seu omnipotente esbanjamento de afetos. A nação, carente e suspirosa, caiu-lhe nos braços e deixa-se afagar, depois de longos anos de secura com um mumificado Cavaco.
Marcelo conhece os efeitos balsâmicos de um abraço aconchegante, de palavras sussurradas ao ouvido, no momento certo, quando quem está esmagado pela dor sente o consolo que vem, inusitadamente, do topo da hierarquia do Estado.
Pode dizer-se que internacionalizou o abraço, numa fotografia que correu mundo e foi partilhada nas redes sociais da revista  “Time”.

Mas sabe também aproveitar todos os momentos, retirar de cada oportunidade apenas sugerida, escassamente percebida pelos outros, o máximo proveito para os seus desígnios. E como quase não dorme, sobra-lhe tempo para as mais inesperadas elucubrações.
Enquanto António Costa negociava a ajuda europeia em Bruxelas, Marcelo prosseguia, incansável, o seu périplo de amplexos e enleios, passando ao mesmo tempo uma rasteira traiçoeira ao homem que zelosamente o tinha informado, atempadamente, sobre as medidas que haviam sido programadas e sobre a demissão, então em marcha, da ministra da Administração Interna. Mesmo assim, optou pela dissimulação, pelo simulacro, encenou o grande espetáculo dramático e, como se nada soubesse, do alto, do seu cargo de Chefe de Estado e de Comandante Supremo das Forças Armadas não resistiu a zurzir o Governo num tom severo e tonitruante como até então ninguém lhe tinha ouvido, que soou como música angelical à sua família política.
Veio, pois, exigir que se cumprisse o que antecipadamente sabia ia ser cumprido. Mas não se ficou por aí, foi mais longe, ameaçou com as consequências da moção de censura que a sempre diligente e virtuosa Cristas lhe colocava à disposição e que acabou por resultar num favor ao Governo.

Houve jornalistas que souberam, pouco antes do discurso do Presidente, que a ministra ia ser demitida, mas preferiram não divulgar. Estavam distraídos com outros sinais de fumo… Apenas Daniel Oliveira deu conta desse facto publicamente e quando o fez no programa “Eixo do Mal” do passado dia 21, foi logo fustigado pelos presentes. Só no dia 26 o “Público” fez manchete do assunto, seguido do DN.

Marcelo respira política por todos os poros, da pontinha dos cabelos às unhas dos pés. Provavelmente desde o berço!
Já assim era na Faculdade de Direito de Lisboa. Quando numa greve geral ― antes do 25 de abril de 1974 ― os campos se extremaram a tal ponto, entre estudantes de direita e de esquerda, que os confrontos físicos, ultrapassaram as barricadas, o sangue correu e a polícia de choque, como de costume, fez a sua brutal aparição, Marcelo Rebelo de Sousa, afilhado de Marcelo Caetano, filho de um ministro de Salazar, não furou a greve como alguns, seus escassos colegas do 5.º ano fizeram. Estou a lembrar-me de Braga de Macedo que, apesar de agredido rompeu os piquetes de greve, em coerência com as suas ideias de direita.
E o jovem Marcelo era de esquerda? Claro que não.
Fez greve? Também não.
Então? Foi fura-greves? Nãããão, destoar-lhe-ia no currículo.
Recordo-me de o ver do lado de cá da barricada, ou seja, onde nós estávamos, os estudantes de esquerda. Trocava palavras amistosas, observações casuísticas, com quem lhe desse troco, num tom afável, como se não fosse nada com ele. Parecia um observador investido superiormente por uma entidade desconhecida dos demais..

Quem diria? Aquele que viria a ser o futuro Presidente da República de Portugal dava os primeiros passos na coabitação política, preparava já o seu caminho, com a inteligência e a habilidade que todos lhe reconhecem, a frieza, o calculismo e a  premeditação que poucos ainda lhe atribuem.

Os últimos acontecimentos, particularmente o mais recente episódio com António Costa, remetem-me para a fábula do escorpião e da rã. Tal como o escorpião, Marcelo não pode evitar a sua própria natureza.

Maria Teresa Sampaio
27 de Outubro de 2017 


NÃO PASSARÃO!

NÃO PASSARÃO!

Os mandantes dos pirómanos, os verdadeiros criminosos, que verdadeiramente lucram com os fogos; aqueles que ficam bem de longe, comodamente instalados nos sofás, a assistir ao avanço imparável das chamas, calculando os milhões que hão de receber em adjudicações, ou por outros meios menos lícitos;
  
Não passarão!

Os “Passos Perdidos”, que não resistiram ao calor do fogo e reapareceram para lançar mais gasolina no incêndio, que ajudaram a atear quando desgovernaram o país;

Não passarão!

As “Cristas Encaliptadas”, que no seu tempo de governantes franquearam o terreno à livre expansão do eucaliptal em terras lusas e agora insistentemente reclamaram a cabeça da ministra da Administração Interna;

Não passarão!

Nem as “Cristas Encaliptadas”, nem os Magalhães, nem os “Passos Perdidos”, nem os Hugos Soares, nem os outros de idêntica laia, que no Parlamento foram protagonistas do mais sádico, mais degradante e macabro espetáculo, montado pelos seus partidos (em vez de uma cerimónia simbólica adequada ao luto nacional), unicamente para humilhar, envergonhar e espezinhar o primeiro-ministro.

Não passarão!

Nem as atitudes de arrogância, nem a falta de humildade, nem a incapacidade de reconhecer as falhas, nem as palavras secas de distanciamento e de frieza, sobretudo em tempos de tragédia, quando as pessoas precisam de maior empatia e sensibilidade da parte de quem os governa. Mas também hão de ser desvendados os excessivos afetos que podem, por vezes, ocultar a mais subtil manipulação ou o ligeiro tique, prenunciador de uma síndrome calculista e maquiavélica, capaz de tão inesperada quão violenta estocada final;

Não passarão!

Os mestres da retórica e do jogo político tortuoso, atrás dos quais escondem a incapacidade de resolver os problemas mais prementes do país; 

Não passarão!

Aqueles que escamotearem a vontade legítima de levar a cabo uma investigação, por todos os meios legais, para apurar as suspeitas de terrorismo incendiário ou de uma conspiração mais vasta, para inverter a marcha do país, deixando-o sem recursos naturais, económicos e financeiros, sem confiança, nem esperança e sem futuro, à mercê de interesses ocultos;
  
Não passarão!

Aqueles, sem ética nem dignidade, cujo único objetivo é desarticular e tornar inoperante a “Geringonça”, porque encarna os princípios de superação das diferenças através de uma unidade democrática concertada laboriosamente pelo diálogo e a transparência, que abominam;
  
Não passarão!

Os20 de Outubro de 2017. proponentes e apoiantes da moção de censura ao Governo, revestidos de oportunismo político, que tão depressa esqueceram as mortes, a tragédia e o luto nacional.

Resistiremos.
Aprenderemos com os erros e, infelizmente, também com a desgraça.
Seremos mais fortes e faremos Portugal renascer das cinzas.

Maria Teresa Sampaio
20 de Outubro de 2017. 















Cristas no ar. Silêncio e muito barulho.

Cristas no ar. Silêncio e muito barulho.
Motivo: fogos.
Alvo: geringonça.
Meios: todos, os visíveis e os encobertos.
É hora de aproveitar os reveses. Que mais se poderia esperar?!
Manifestações silenciosas, de triste memória na história da nossa democracia, aí estão, convocadas através das redes sociais, por gente que se diz apartidária, tal como em 28 de setembro de 1974, aquela atrás da qual se escondia Spínola, que pretendia inverter o rumo da História. Outras, porém, dispõem-se a fazer mais barulho e juntarem-se às caladas.
“Vão de férias”, dizem os promotores.
Também o bispo de Viana do Castelo considera que “Chegou a hora de dizermos basta” e acrescenta, “Que ninguém se cale. Quem cala consente. Calar-se é colaborar no mal que está a destruir a nossa querida Nação”.
Estranho é que gente tão atenta, tão cívica, tão consciente dos seus direitos e deveres, tão solidária, tão religiosa e apartidária, se tenha autossilenciado durante tantos anos e se agite freneticamente agora, a coberto da dor e do desespero legítimos das populações atingidas pela calamidade extrema e completamente inusitada destes fogos, exatamente quando se anuncia que vão ser tomadas as medidas preconizadas no Estudo elaborado pela Comissão Independente proposta pela oposição.
Que coincidência, estas pessoas tão apartidárias repetirem as palavras e as acusações de alguns senhores da oposição e fazerem coro com uma parte infelizmente acéfala de jornalistas e comentadores da nossa praça.
Que coincidência estas movimentações ocorrerem quando já o CDS vai apresentar uma moção de censura ao Governo, apoiada pelo PSD. Todos os fins são políticos, nada mais.

Não há coincidências. A história ensina-nos que não devemos distrair-nos, nem desarmar, porque eles estão aí, de cristas ao vento e se eles se unem, nós também nos unimos. Como sempre o fizemos. Sem soçobrar.
 
 Maria Teresa Sampaio.
 17 de outubro de 2017